Pontos de Vista | Raul Serra

FÉ E ARQUITETURA

Escala e Rigor

O acto de projectar e construir um edifício deveria ter como princípio a resolução do
problema em causa, o programa a que foi proposto, mas também gerar a capacidade
de emocionar. Nesse sentido, o sentido da fé e a arquitectura estão relacionados
desde a concepção à concretização da obra.

Na percepção pessoal do acto de conceber um projecto ou vivenciar um edifício, é toldado por muitos factores que vão moldando o processo, mas gostaria de resumir a relação próxima entre o sagrado e a experiência em dois conceitos: Escala e Rigor.

A percepção da escala é essencial para a vivência de um espaço, seja nas imponentes catedrais góticas que procuravam o céu com os seus altos tectos, como numa pequena capela que permite maior proximidade sensorial. A Escala sempre foi argumento de relação da fé com os Homens e permitiu a cada pessoa ter uma experiência única e sensorial. Esse controlo da escala, fosse na tipologia de uma planta, disposição do espaço ou definição da altura, é transversal ao longo da história da arquitectura e dos Homens, uma definição de escala que acaba por receber e ser moldada por outras influências importantes como a materialidade, a luz/sombra e até o som.

O segundo conceito é o Rigor.
Rigor no sentido de controlo do detalhe e da proporção, na forma de como a precisão ajuda na relação com o sagrado, escrevia Mies Van Der Rohe “God is in the Details” (“Deus está nos detalhes”) e, apesar de ser algo que pode ser interpretado levianamente, essa forma de pensar é algo que me inquieta positivamente, encontrar Deus nos detalhes, no rigor impresso até no mais pequeno detalhe, é enriquecedor da experiência do espaço, e potenciador da relação da arquitectura com a fé.

O corpo relaciona-se com o espaço, as sensações são limitadas ou potenciadas pelo espaço, pela sua escala e pelo seu rigor. Uma arquitectura com capacidade de emocionar, acreditando que se aproxima da Fé. Os lugares de culto e, nomeadamente os espaços associados à Fé Católica que estão mais presentes na nossa cultura portuguesa, são o expoente máximo dessa relação.

O mais interessante é que não é necessária ostentação ou grandeza para atingir esse “objectivo” sensorial, necessitam apenas de ser espaços em que a escala e rigor do Arquitecto foram preponderantes nessa capacidade de construir algo além do óbvio, sagrado, mais próximo do Além.

Fotografia: João Morgado

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