Fátima ao detalhe | 13 junho 1917

Ao contrário do inicialmente acordado entre o Francisco, a Jacinta e a Lúcia a Aparição de maio rapidamente se tornou conhecida não só no núcleo familiar dos pastorinhos, mas também entre a população de Fátima e a das povoações vizinhas. Por isso, ao contrário do ocorrido no mês anterior, chegado o dia 13 de junho, a Aparição não só não decorreu na tranquilidade de “um dia normal” de pastorear os rebanhos da família – era dia de St.º António e, por isso, a festa da Freguesia[2] – mas também não decorreu na privacidade e intimidade do “grupo dos três” pois, segundo os relatos da época, “juntaram-se ali cerca de sessenta pessoas”[3].

Uma vez mais, prescindimos da narrativa da Aparição e respetivo diálogo, amplamente divulgados nas Memórias da Irmã Lúcia I[4], para nos focarmos na história da narrativa que “envolve” a Aparição e que nos permite compreender em maior profundidade o diálogo que nela se desenvolve.

A narrativa desta Aparição, longe de ser algo estático e estanque, produzido e fixado num dado momento, apresenta-se-nos como algo dinâmico, verbalizado/partilhado à medida que é progressivamente vivido e compreendido, pelo que os curtos relatos dos interrogatórios de 1917, do primeiro relato escrito por Lúcia acerca das Aparições, e do interrogatório oficial do processo canónico[5] – que pouco mais referem que o pedido de que os videntes aprendam a ler e do pedido de cura de alguns doentes – ocultam aquilo que, à época, eles guardavam já como “segredo” – embora sem o pedido formal de que assim o fizessem – dado o caráter profundamente íntimo e pessoal do conteúdo da Aparição[6].

Apenas 10 anos mais tarde – depois das Aparições de Pontevedra, em que o conteúdo desta aparição, a devoção ao Imaculado Coração de Maria, se desenvolvia e aprofundava, e de parte do conteúdo do diálogo, a morte prematura de Francisco e Jacinta, se ter já realizado – Lúcia relata pela primeira vez a totalidade do diálogo com Nossa Senhora, que mais tarde fixará definitivamente na redação da sua IV Memória (8/12/1941).

No entanto, apesar de a totalidade do conteúdo da Aparição estar já totalmente revelado, a profundidade do seu significado vai sendo progressivamente rezado e meditado por Lúcia que, à medida que vai penetrando na profundidade do seu significado, em diversas ocasiões regista por escrito a sua compreensão e vivência dessas realidades, como acontece nos processos informativos para a beatificação de Francisco e Jacinta[7] e no seu último escrito publicado, já postumamente, “Como vejo a mensagem”[8], no qual nos deixa a sua interpretação madura – humana e espiritualmente – dos acontecimentos por ela vividos na infância.

Ir. Benedita Costa, asm


[1] Por uma questão de acessibilidade de consulta de fontes para aqueles que desejarem aprofundar o tema, citamo-las a partir da obra de Luciano Coelho Cristino (CRISTINO, L. C., As Aparições de Fátima: reconstituição a partir dos documentos, Fátima, Santuário de Fátima, 2017, 1ª ed.), na qual cada Aparição foi tratada individualmente do ponto de vista das fontes documentais.

[2] Cf. JESUS, Lúcia de, Memórias da Irmã Lúcia I, Fátima, Secretariado dos Pastorinhos, 2007, 13ª ed., p. 82.

[3] Cf. CRISTINO, L. C., As Aparições…, p. 39.

[4] JESUS, Lúcia de, Memórias…, p.175-176.

[5] Estes documentos, bem como outros de igual importância, podem ser consultados na íntegra em: DOCUMENTAÇÃO Crítica de Fátima: Seleção de Documentos (1917-1930). Fixação de textos, introduções e notas por Luciano Coelho Cristino. Fátima: Santuário de Fátima, 2013.

[6] A explicação dos diversos motivos que levaram os videntes a considerar como “segredo” parte do conteúdo desta aparição está claramente explanada em: CRISTINO, L. C., As Aparições…, p. 41-42.

[7] Cf. CRISTINO, L. C., As Aparições…, p. 45-46.

[8] JESUS, Lúcia de, Como vejo a mensagem, através dos tempos e dos acontecimentos, Coimbra: Carmelo; Fátima: Secretariado dos Pastorinhos, 2006, p. 42-44.

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