13 de outubro de 1917[1]
Após a repetição da promessa de que no mês seguinte se daria “um milagre para que todos acreditassem” – notícia que, usando o método mais eficaz de divulgação desse tempo, o boca a boca, rapidamente chegou não só de norte a sul do país mas, inclusivamente, além fronteiras –, os dias que antecederam o 13 de outubro de 1917 foram caracterizados por um intenso – e nunca antes visto –movimento de peregrinos e curiosos em direção ao, até então, inóspito, desconhecido e pouco acessível lugar da Cova da Iria.
Como a própria Irmã Lúcia nos refere no relato que nas suas Memórias nos faz deste dia[2] – do qual prescindimos quanto ao que ela, juntamente com os seus primos, viram enquanto a multidão presenciava o milagre do sol – a multidão presente nesse dia na Cova da Iria era de tal modo numerosa que, para poder garantir a sua presença na “à hora marcada” por Nossa Senhora, os Pastorinhos tiveram que sair de casa “bastante cedo, contando com as demoras do caminho”.
A leitura do relato das Memórias desta Aparição, (quase) nada nos refere relativamente ao “Milagre do Sol” propriamente dito que – para grande espanto de todos – nenhum dos Pastorinhos viu, uma vez que, enquanto este decorria, eles contemplavam a sequência de visões narrada nas Memórias, como nos confirma uma resposta de Lúcia a um dos interrogatórios que se seguiram à Aparição: «Na ocasião em que estava a ver esta imagem, estava o povo a gritar: Olhem! Olhem! Tão bonito! E eu também olhei, a dizer ao povo que olhassem para lá, que estava São José e depois Nosso Senhor»[3].
Este fenómeno solar foi atestado e relatado por milhares de testemunhas – crentes e não crentes – que, marcadas pela experiência vivida não podiam “não-proclamar” o que tinham visto e ouvido naquele dia. A dimensão do evento esperado era de tal modo grande que «“O Século”, de Lisboa, mandou um enviado especial à Cova da Iria, na pessoa de Avelino de Almeida, que intitulou o seu artigo, no dia 15 de outubro: “Coisas espantosas! Como o sol bailou ao meio-dia em Fátima – As aparições da Virgem – Em que consistiu o sinal do céu – Muitos milhares de pessoas afirmam ter-se produzido o milagre – A guerra e a paz”»[4].
Efetivamente, são inúmeros os relatos de cores e movimentos inexplicáveis, bem como dos efeitos que estes tiveram na multidão, dos quais, a título de exemplo, trazemos apenas dois:
«A chuva era torrencial, desde manhã. À voz da Lúcia, a chuva parou. Depois, o sol foi visto pela multidão como um disco de prata fosca, sem brilho, tomando as várias cores do arco-íris: laranja, verde, azul, rosa e dourado. A certa altura, pareceu desprender-se do céu e precipitar-se sobre a terra. Seguidamente, pareceu rodopiar sobre si mesmo. Este movimento fez com que a multidão gritasse: “Milagre! Milagre! Perdão e misericórdia!”. A duração deste movimento foi calculada diversamente: de dez a quinze minutos.»[5].
«Como toda aquela multidão, olhámos, então, para o sol com atenção sustentada e, através das nuvens, vimo-lo com aspectos novos: novos para nós, note-se bem. Umas vezes rodeado de chamas encarniçadas, outras vezes aureolado de amarelo ou roxo esbatido, outras vezes parecendo animado de velocíssimo movimento de rotação, outras vezes, ainda, aparentando destacar-se do céu, aproximar-se da terra e irradiar um forte calor. Para quê, negá-lo? Estes fenómenos que jamais tínhamos visto, impressionaram-nos fortemente»[6].
Terminamos com as palavras que D. José Alves Correia da Silva, Bispo de Leiria, incluiu, a respeito do “Milagre do Sol”, na Carta Pastoral com que declarou as Aparições da Cova da Iria como “dignas de crédito”[7]: «Esse fenómeno que nenhum observatório astronómico registou e, portanto, não foi natural, presenciaram-no pessoas de todas as categorias e classes sociais, crentes e descrentes, jornalistas dos principais diários portugueses e até indivíduos a quilómetros de distância, o que destrói toda a explicação de ilusão colectiva»[8].
Ir. Maria Benedita Costa, asm
[1] Por uma questão de acessibilidade de consulta de fontes para aqueles que desejarem aprofundar o tema, citamo-las a partir da obra de Luciano Coelho Cristino (CRISTINO, L. C., As Aparições de Fátima: reconstituição a partir dos documentos, Fátima, Santuário de Fátima, 2017, 1ª ed.), na qual cada Aparição foi tratada individualmente do ponto de vista das fontes documentais.
[2] JESUS, Lúcia de, Memórias da Irmã Lúcia I, Fátima, Secretariado dos Pastorinhos, 2007, 13ª ed., p. 180-181.
[3] CRISTINO, L. C., As Aparições…, p. 95.
[4] CRISTINO, L. C., As Aparições…, p. 94.
[5] CRISTINO, L. C., As Aparições…, p. 91-92.
[6] CRISTINO, L. C., As Aparições…, p. 97.
[7] “Carta Pastoral de D. José Alves Correia da Silva, Bispo de Leiria, sobre o culto a Nossa Senhora de Fátima”, DOCUMENTAÇÃO Crítica de Fátima: Seleção de Documentos (1917-1930). Fixação de textos, introduções e notas por Luciano Coelho Cristino. Fátima: Santuário de Fátima, 2013, Doc. 133, p. 539-551.
[8] CRISTINO, L. C., As Aparições…, p. 99.