RUBRICA
OS SANTOS E NÓS
Mafalda Martinho, asm
Noviça da Aliança de Santa Maria


SANTO ANJO DE PORTUGAL


Sim, os anjos existem! Recuemos ao século passado e fixemos o nosso olhar sobre a pequena aldeia de Aljustrel (Fátima). Foi nessa pequena aldeia, entre abril e outubro de 1916, que os pastorinhos Francisco, Jacinta e Lúcia receberam, por três vezes, a visita de um anjo: o Anjo de Portugal. A primeira aparição passou-se na primavera, quando os pastorinhos estavam a brincar junto à Loca do Cabeço. Ao chegar junto deles, disse-lhes que era o Anjo da Paz e convidou-os a rezarem com ele, ensinando-lhes uma oração. Na segunda aparição, ocorrida junto ao Poço do Arneiro num dia de verão, o Anjo convidou-os uma vez mais à oração e à oferta de sacrifícios, em ato de reparação e de súplica pela conversão dos pecadores. A terceira e última aparição ocorreu no outono, novamente na Loca do Cabeço. O Anjo ensinou aos pastorinhos uma nova oração e deu-lhes a Sagrada Comunhão. Por fim, apelando à reparação (“consolai o vosso Deus”), desapareceu, deixando a alma dos pastorinhos completamente concentrada em Deus.

Diante de tudo isto, não deixa de ser curiosa (e interpeladora) a atitude do Francisco depois de cada uma destas aparições. Ele, embora conseguisse ver o Anjo, era o único dos três que não ouvia as suas palavras. Por esse motivo, no final de cada aparição, perguntava à Lúcia e à Jacinta tudo quanto o Anjo lhes tinha dito. O Francisco não tinha medo de fazer perguntas - Quem é o Altíssimo? Que quer dizer: os Corações de Jesus e Maria estão atentos? Etc. - e quando não compreendia voltava a questionar. E logo depois, acolhendo as respostas e os silêncios, era o primeiro a dizer: “O Anjo é mais bonito que tudo isso. Pensemos n’Ele.”

E nós? Será que temos a ousadia de perguntar o significado destas aparições? O que é que o Anjo de Portugal e as suas aparições nos dizem hoje?... Estou em crer que o Anjo nos mostra e ensina essencialmente três coisas:

  1. A oração como escola para crescer no conhecimento de Deus
  2. A oferta da vida diária como súplica pela conversão dos pecadores
  3. A adoração como ato de reparação e consolação


Olhemos para a oração como escola para crescer no conhecimento de Deus. Quando o Anjo apareceu pela primeira vez aos pastorinhos, estes estavam entretidos nos trabalhos rotineiros com as ovelhas, que iam realizando entre brincadeiras. O Anjo aparece-lhes então no ordinário das suas vidas e a primeira coisa que lhes pede é que rezem com ele. O Anjo de Portugal é um anjo orante que reza e ensina a rezar, o que faz dele um autêntico pedagogo. O Anjo torna-se um mistagogo para os pastorinhos, iniciando-os na fé, esperança e caridade – as três dimensões teologais da existência cristã. Por outras palavras, o Anjo assinala uma alteração súbita e inesperada na normalidade quotidiana e serve de mediador entre o humano e o divino. Apelando constantemente à oração e ensinando-nos a rezar – rezando connosco –, o Anjo de Portugal apresenta-nos um itinerário espiritual para crescermos na relação com Deus. Sendo mestre, introduz-nos na escola da oração, com o propósito de conhecermos mais e melhor Aquele que o enviou. À medida que se aproximava, os pastorinhos iam-lhe distinguindo as feições. E aquele que outrora não se via, revela-se surpreendentemente de uma grande beleza. A oração como escola para crescer no conhecimento de Deus permite-nos viver esta mesma experiência com o próprio Deus. À medida que nos aproximamos na oração, a beleza do rosto de Deus vai-nos sendo revelada e apresentada.

A par do pedido de oração constante, o Anjo pede a oferta de sacrifícios como súplica pela conversão dos pecadores. Os pastorinhos perguntaram-lhe como se poderiam sacrificar e, em resposta, o Anjo disse-lhes que de tudo o que pudessem oferecessem sacrifícios. Ensinou-lhes, desta forma, que os sacrifícios quotidianos agradam a Deus, não sendo necessárias ações espalhafatosas. O Anjo de Portugal aprofunda, assim, a espiritualidade do quotidiano, que nos leva a compreender como Deus nos ama e quer ser amado. A espiritualidade da oferta da vida diária conduz-nos ao cerne da mensagem trazida pelo Anjo e, portanto, ao cerne de todo o Evangelho: a universalidade da possibilidade de salvação. A oferta da vida diária torna-se súplica pela conversão dos pecadores quando, por amor, nos transfiguramos em caridade incarnada. Isto é, quando nos tornamos incarnação do ato caritativo de Deus, com pequenas ofertas à oferta da própria vida, somos meio de salvação para todos aqueles que não creem, não adoram, não esperam e não amam.

E isto leva-nos à adoração como ato de reparação e consolação. Na sua terceira aparição, o Anjo pediu aos pastorinhos que reparassem os crimes do mundo e consolassem a Deus. Infelizmente, os ultrajes, sacrilégios e indiferenças contra o coração de Deus continuam a ofendê-lO. A gravidade do pecado exige a urgência da reparação. Por isso, o Anjo de Portugal – que é também o Anjo da Adoração – indica-nos a adoração como via de consolação. Adorar Deus é aceitar o Seu amor. Trata-se de nos reconhecermos como pecadores amados. Reparar e consolar Deus é aceitar ser criatura e, com palavras ajoelhadas, desagravar o coração do Criador.

É isto que o Anjo de Portugal nos mostra e ensina. No dia de hoje, é esta a sua mensagem para nós. Contudo, mais importante que descodificar e interpretar a mensagem do Anjo, é acolhê-la e pô-la em prática, no concreto das nossas vidas. Façamos do Anjo de Portugal um companheiro e amigo. Participemos na sua escola e ofereçamos a nossa vida em atitude de adoração. Percorramos com ele o caminho proposto, já que se trata de um caminho seguro, cuja meta é somente o Céu.


janeiro 2024
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